Cem transplantes de pulmão em Santa Marta. "O que faço com tanto ar?"
Equipa nunca fez tantos transplantes como nos últimos meses e quer instalar este ano uma máquina que permite recuperar pulmões para serem transplantados.
No dia em que Susana pôde sair à rua sem máscara, Ricardo estava a entrar no bloco. São dois rostos dos cem transplantes pulmonares realizados no país desde 2001, no Hospital de Santa Marta, em Lisboa, e conheceram-se ontem por acaso no final da cerimónia que assinalou a meta. A 22 Janeiro de 2013, quando Susana fez um ano de transplante e Ricardo ia a caminho do seu, ela era uma das fontes de esperança da família dele.
Transplantada em 2012 com 13 anos, a mais jovem doente no país tinha um blogue com as suas lutas e vitórias depois de ter sido diagnosticada com fibrose quística aos dois anos. A doença foi-lhe estragando os pulmões ao ponto de só poder ir à escola com garrafas de oxigénio e não conseguir falar. Ricardo, engenheiro de 38 anos e com uma filha de um, tinha tido até há seis meses uma vida saudável. Não fumava e fazia desporto. Cansaço e dificuldade em respirar revelaram uma fibrose pulmonar idiopática, a doença por trás da maioria dos transplantes e que os médicos não conseguem explicar porque ocorre. Mas o caminho seria igual ao de outros doentes, daí a importância dos posts da jovem na página "A Luz da Esperança".
Ricardo só quer voltar a ter uma vida normal e foi em Santa Marta que ficou perto disso. Continua a lutar, mas espera em breve voltar a trabalhar. Hoje, com 16 anos, Susana recorda a sua segunda oportunidade com uma serenidade a que o pai, ao lado, responde com um sorriso: "estava em fase terminal" no hospital, diz a jovem, quando recebeu a notícia de que ia ser transplantada. Queria viver e mesmo internada, nunca chumbou um ano. "Se os pulmões tivessem chegado em Fevereiro, não estava cá."
A expressão de Susana nos primeiros tempos depois do transplante, "não sei o que fazer com tanto ar", foi uma das memórias que marcou a intervenção do médico José Fragata, desde 2007 à frente do serviço. O médico considerou os doentes, muitos na plateia, os "heróis das comemorações" e agradeceu-lhes os ensinamentos de esperança e bravura.
Em dia de homenagem, houve mais agradecimentos. Fragata lembrou Rui Bento, o médico responsável pelo primeiro transplante cardiopulmonar em 1991, que em breve dará nome à ala de transplantes do hospital. Depois, invocou os 13 anos que o país já leva com um programa de transplantação pulmonar, lembrando que em 2008, com apenas dois transplantes, esteve em risco de acabar.
A renovação da equipa, o diálogo permanente e o apoio de colegas espanhóis, em formação e no transplante de doentes portugueses, foram algumas das forças apontadas pelo médico. Mas também a disciplina e resiliência explicam o sucesso, medido por Portugal estar hoje perto de se tornar auto-suficiente. "Muitas vezes fizemos briefings depois de um transplante às 5 da manhã, para que cada erro fosse o último", disse o médico, sublinhando que têm formado especialistas para que a resposta nacional nesta área nunca seja interrompida. À medida que aumentou a experiência, melhorou a sobrevivência dos doentes e reduziram--se os custos. Uma relação invocada por Fragata para defender que mesmo que seja necessário continuar a enviar doentes para Espanha Portugal deve ter apenas um centro nesta área.
De olhos no futuro, e inspirados por colegas espanhóis que vieram às comemorações, a equipa pretende instalar ainda este ano uma máquina que permite recuperar pulmões de dadores que hoje não são usados por terem lesões ou infecções. Mantém o órgão a funcionar artificialmente, à temperatura do corpo humano, até que fique bom para transplante. Custa 20 mil euros por ano mas poderá aumentar a capacidade, o que não se recusa. Apesar de Santa Marta estar com uma actividade recorde, há 26 doentes à espera.
Paulo Macedo elogiou a postura da equipa ao garantir "continuidade", o que disse faltar noutras áreas de excelência. O ministro garantiu que a transplantação vai continuar a ser reforçada, lembrando o recente aumento de incentivos para que os hospitais façam colheitas. Mas reiterou ter sido uma "boa opção" o corte de 50% de todos os suplementos em 2011. Fragata admitiu que essa decisão da tutela prejudicou a actividade mas considerou ter sido por um "bem maior", defendendo que os incentivos eram "excessivos".
Mas porque o dinheiro faz cada vez mais parte da equação do SNS, o médico fez questão de mostrar como o custo de 80 mil euros por cada ano de vida associado ao transplante pulmonar parece o "pior investimento". Mas garante o "direito inegável" a respirar. Susana, na plateia, estava atenta. Quer ser economista e sempre quis perceber todos os assuntos a fundo, mesmo estes.
(Artigo retirado do Jornal i) - http://www.ionline.pt/artigos/portugal/cem-transplantes-pulmao-santa-marta-faco-tanto-ar/pag/-1
É com muito orgulho que faço parte desta equipa de Santa Marta e agradeço todos os dias pela nova oportunidade de renascer, e é juntamente com uma enorme alegria que vejo os Transplantes Pulmonares a aumentarem, pois mais transplantes significa mais vidas, mais oportunidades, mais sobrevivência, mais esperanças no olhar, mais sorrisos, mais gratidão, mais sonhos, mais ar…
Mais uma vez, um GIGANTE OBRIGADA à equipa de Santa Marta pelo trabalho excelente que fazem todos os dias e pelas novas oportunidades de viver, estou eternamente grata!